Os votos (foram poucos) deixados nos comentários do post passado se espalharam entre vários episódios - e, assim, o vencedor foi eleito com apenas dois votos. Mas promessa é dívida e, então, deixo aqui o Capítulo 14 do livro que estou escrevendo sobre Breaking Bad. (Post exclusivo para assinantes pagos do blog.)
Negro y Azul (T02E07)
(exibição inicial: 19/04/2009)
Dirigido por Félix Enríquez Alcalá. Roteiro de John Shiban. Fotografia: Michael Slovis. Montagem: Lynne Willingham. Música: Dave Porter. Direção de arte: Robb Wilson King. Figurinos: Kathleen Detoro.
Com: Bryan Cranston, Anna Gunn, Aaron Paul, Dean Norris, Betsy Brandt, RJ Mitte, Krysten Ritter, Matt Jones, Charles Baker, Rodney Rush, Christopher Cousins, J.D. Garfield, Todd Terry e Danny Trejo.
Lançado em 2013 e dirigido pelo israelense Shaul Schwarz, o documentário Narco Cultura é uma boa referência para quem tem curiosidade em saber um pouco mais sobre a tradição dos narcocorridos, um subgênero musical mexicano centrado em canções que romantizam chefões e matadores do tráfico, não sendo acaso que alguns de seus principais artistas tenham shows patrocinados por poderosos cartéis. Ainda assim, considerando como os narcocorridos são um fenômeno mais conhecido localmente, é notável que Vince Gilligan e o roteirista John Shiban tenham decidido abrir Negro y Azul, que marca o meio da segunda temporada, com um videoclipe que traz a banda Los Cuates de Sinaloa cantando uma balada dedicada a ninguém menos do que o próprio Heisenberg.
Representando mais um teaser que a princípio pode confundir o espectador ao abrir a narrativa de modo inesperado e misterioso, os três minutos e vinte segundos dedicados à “Balada de Heisenberg” abordam o sucesso da metanfetamina produzida pelo enigmático Heisenberg e como este vem incomodando os chefões dos cartéis ao sul da fronteira dos Estados Unidos, transformando-o em um alvo em potencial. Com letras escritas por Gilligan e adaptadas para o espanhol pelo produtor musical Pepe Garza, conhecido como o padrinho dos narcocorridos (ele também compôs a melodia), a canção é ilustrada com efeitos gráficos baratos (que aqui e ali assumem a configuração de cristais) enquanto o trio de músicos surge tocando violões com as cores da bandeira mexicana e imagens de Jesús Malverde, o “santo patrono do narcotráfico”. Além disso, como os videoclipes reais do gênero, que muitas vezes incluem registros de figuras existentes no meio, a versão de Breaking Bad já adianta a presença de Tortuga (Trejo), que se tornará importante ao longo do episódio.
Quando esta sequência chega ao fim, porém, o que vem a seguir não poderia estar mais distante do icônico Heisenberg, que aparece em sua versão Walter White tentando explicar um conceito químico para um aluno que implora por dois pontos que o salvariam da recuperação na matéria – e o fato de fingir considerar a possibilidade antes de responder com um “não” que denota certo prazer é uma postura que as observações vistas na correção da prova de Jesse em Cancer Man (T01E04) já sugeriam fazer parte da personalidade do sujeito como professor. Por outro lado, se esta intransigência pedagógica é antiga, a implacabilidade que ele pareceu demonstrar ao final de Breakage (T02E05), quando ordenou que o sócio “lidasse” com o roubo que sofreram, dá sinais de suavização, levando-o (tarde demais) a tentar voltar atrás.
O horror que testemunhou na residência dos Spooge, diga-se de passagem, deixou cicatrizes profundas em Jesse, que se tranca na escuridão de sua casa e tenta apagar as memórias e conter as náuseas através das drogas. Aliás, os efeitos deletérios de Walt sobre o rapaz já podem ser observados na diferença do tom da mensagem automática gravada por este: se antes ela soava alegre, empolgada e irreverente (“Yo, yo, yo, 1483 para o 3, para o 6, para o 9, representando o ABQ! E aí, vadia? Fale depois do bipe!”), agora é dita quase com tristeza (“Yo, se eu te conheço, deixe uma mensagem.”) – e mesmo que o protagonista pareça sentir certa culpa ao ver o estado do ex-aluno, chegando a soltar um discreto pedido de desculpas em determinado momento, seu narcisismo é novamente exposto quando interrompe Jesse, que começava a desabafar sobre o pequeno filho dos Spooge, para saber mais detalhes sobre o que ocorreu e avaliar se há algum risco de que a polícia os descubra. Além disso, ao constatar que o incidente pode beneficiá-los ao estabelecer a fama de impiedoso de Jesse – a ironia! -, Walt não hesita em confirmar os rumores (mesmo que por omissão), sorrindo satisfeito diante da oportunidade.
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